Ah… o anime da baba… o asqueroso e escroto anime da baba! ZZZZZZZZZZZZ… nada a declarar.
Há sensibilidade em Nazo no Kanojo X, uma tentativa de trabalhar a puberdade masculina, em suas fantasias, sonhos, excitações, sentimentos, dúvidas e desejos, de uma forma romântica, por vezes excessivamente romântica. Por que excessivamente? Porque mais do que amor, mais do que sentimentos, Nazo no Kanojo X fala de sexualidade e erotismo, fala de testosterona, de carne, de um menino que tem seu corpo transformando-o em jovem, mas que sua cabecinha ao mesmo tempo não acompanha o mesmo ritmo. Tsubaki diz ter 17 anos, mas sua aparência e mentalidade é de alguém de no máximo uns 13. Por essas e outras eu fiquei em dúvida se deveria utilizar o termo ‘puberdade’ para alguém com 17 anos. Mas enfim, é o que parece.
O título por si só identifica que a história é na perspectiva de Tsubaki. É a história sobre a namorada misteriosa de Tsubaki. E realmente, sabemos muito sobre Tsubaki (não muito, na verdade, mas o pouco que sabemos dele é tudo, então tá valendo), e bem pouco sobre sua namorada misteriosa (mais do que sabemos dele, mas ainda assim muito menos do que há para saber). De onde vem Urabe? O que faz da vida? De onde vem sua habilidade sobrenatural com a tesoura? Por que seu estilo alternativo? Quem é Urabe? Estas respostas, se existirem, não são essenciais. É o mistério que vale. Existem tantos mistérios em torno de Urabe que a torna distante, tão distante do pequeno, comum e previsível Tsubaki.
Tsubaki é um livro aberto. É um garoto comum sem grandes talentos, sem grandes aspirações. Não é invejado nem odiado por ninguém. Diferente de Urabe, que já ao chegar à sala de aula causa impacto nos demais, Tsubaki é mais um. Tão comum que para ele entender a excentricidade da exótica Urabe torna-se um exercício de deslumbramento, de descoberta. É o diferente, o exótico da Urabe que desperta o interesse em Tsubaki. São estes elementos que o deixam apaixonado. Importante dizer: todo este deslumbramento, todo este encantamento, toda esta sensação de estar diante de um ser especial e não apenas uma mulher comum, são também coisas cotidianas e normais na puberdade (na verdade se estende para toda a vida) de um garoto. Fantasias integram o pacote adolescência. E depois de instalado em nossas cabecinhas, vai pra vida toda.
Tá, ok, o jeito misterioso e exótico de Urabe não foi a primeira coisa que despertou interesse em Tsubaki. Primeiro foi o impulso sexual que na puberdade está borbulhando. Segundo foi a baba. E só em terceiro lugar veio o estilo misterioso de Urabe. Obviamente foi por fantasia sexual que o rapaz decidiu, por algum impulso, provar da baba sobre a carteira. Não havia ali apaixonamento, muito menos carinho. Era exclusivamente impulso sexual. Depois cria-se um relacionamento que se aprofunda e gera carinho recíproco. Sim, o anime alcança esta etapa.
Sem querer abrir discussões sobre gêneros, é inegável que dessa dualidade decorre o argumento principal da obra. Homens são simples, previsíveis, claros como a luz do dia. Você olha para eles e vê estampado em suas faces o que pensam ou desejam. Provar a baba de Tsubaki é apenas exercício de ratificação. Urabe sabe antes de prová-la o que seu namorado nada misterioso está querendo. Esta previsibilidade não é apenas de Tsubaki, mas de seus colegas de classe e de seu pai, uma figura sem vida que simplesmente é ignorada em todos os episódios, até surgir (mais ou menos porque não faz nada) no episódio final.
Já as mulheres são misteriosas e desconhecidas. As mulheres em Nazo no Kanojo X são cheias de encantamentos, de mistérios, de sensações desconhecidas, contraditórias. Urabe ama Tsubaki? Afinal não é ela que alimenta o ‘vício da baba’? Qual é a razão de agir de Oka? Qual a relação dela com Urabe? Mesmo a antiga paixãozinha de Tsubaki, que retorna numa belíssima sequência de episódios, revela um caráter mais denso. Em crise de relacionamento com o ex-namorado, usa o pobre Tsubaki (da qual sempre soube que babava por ela) para aliviar sua decepção. O que segue é um jogo de poder contra Urabe. Todo o jogo desenrola-se a partir das duas e de Oka. Tsubaki é um mero telespectador de luxo. Ou não, porque estava de olhos vendados.
Não é uma crítica. Eu sinceramente concordo com a ideia de que mulheres são seres mais complexos do que nós. Homens são objetivos e diretos, quando querem algo. Mulheres não. Homens têm muitos dilemas que se resumem a questões sexuais e biológicas. Mulheres revelam que mesmo nos jogos eróticos há outras questões em pauta. Enfim, que mulheres são misteriosas e complexas temos poesias infinitas desde a origem da literatura e da mitologia. Robert Graves escreveu uma tese belíssima sobre isto, na obra intitulada A Deusa Branca: uma gramática histórica do mito poético (obrigatória para quem ama poesia), demonstrando que desde a origem as mais grandiosas poesias eram feitas em honra à Deus Branca, à Musa, à Mulher, este ser encantado. E nem seria necessário recorrer a tal obra, bastaria observar que da Helena homérica aos sambas de Vinicius inundam declarações espontâneas sobre esta verdade. O homem encanta-se com isto, sabe ser simples e ama a complexidade misteriosa feminina.
Não sei se a contraposição ingenuidade e simplicidade masculina x sofisticação e ‘misteriosidade’ feminina, que em Nazo no Kanojo X é elevada e destacada, realmente cumpre este papel: ou seja, o anime realmente quis mostrar como homens têm dilemas bobos e biológicos, e mulheres são mais difíceis de entender, ou faltou um pouco de honestidade? Não sei. Seja como for, ainda que eu concorde que mulheres sejam mais complexas e misteriosas, não concordo que homens sejam tão bananas e previsíveis como nosso querido Tsubaki. Mas repito: se o objetivo era evidenciar, o resultado saiu satisfatório.
Tá, falei de tanta coisa e esqueci da baba né. Ah a baba, asquerosa, escrota e pecaminosa baba. Ai ai, a baba é um vínculo biológico que se estabelece entre nossos queridos protagonistas. Bastante claro, não? Tão claro como a bela baba animada.
Podemos criticar o anime por ser pouco ousado. Poderia não só falar mas ter sexo. Poderia ser mais direto no erotismo. Poderia ser mais biológico, mais carnal. Enfim, colocar as cartas na mesa e não fingir que é um romancezinho colegial. Poderia, poderia. Mas será que talvez isto não prejudicaria a segunda temática que evidenciei: a namorada misteriosa? Nazo no Kanojo X é um anime sobre um garoto que anseia sexo e uma namorada misteriosa (ao menos para ele), e acho que nestes quesitos o enredo se sai bastante bem. Sim, poderia ser mais ousado, mas acho que cumpriu satisfatoriamente o que pretendeu. Sim, há muitos sentimentos e amorzinhos desenvolvidos na história, mas todos eles se baseiam sobre… sexo, biologia, carne. E se para alguns isto não é bonito, para outros é realista. Amor é também carne.